IARTES 2019 – INVESTIGAÇÃO EM ARTES
O desenvolvimento de investigação no campo das artes veio abalar alguns pressupostos da prática artística, ao mesmo tempo que renovou o entendimento do seu lugar no sistema cultural. O campo da arte tem beneficiado desse confronto entre a tradição e a modernidade, tanto nas artes de filiação mais clássica e disciplinar quanto nas práticas emergentes, de cariz progressivamente transversal e híbrido. Percepção que logrou inclusive libertar as artes de índole projectual da ditadura da resolução de problemas, exigindo aos artistas/investigadores decisões sobre as problemáticas que merecem atenção, as que valem a pena ou tão simplesmente a amplitude das questões ou os meios a alocar aos objectos de investigação.
Tal consciência altera as condições de autonomia da arte, questiona a hegemonia estética estabelecida e estimula uma mudança de paradigma que desloca a arte de um regime disciplinar, muito assente na taxonomia e nas condições de visibilidade, para um campo progressivamente expandido (R. Krauss), em que as fronteiras entre áreas de actividade, das Artes Visuais ao Design, do Cinema à Arquitectura, das Media Artes à Performance, se desvanecem. Espera-se do ensino artístico que designe tanto o contacto com um corpus como a aprendizagem de uma praxis, permanecendo todavia ambígua a sua função, dado que frequentemente se considera que a matéria de investigação incide pouco no saber e nos processos do “ofício” e desvia o artista/investigador para prioridades exógenas. Os métodos enraizados e a estruturação dos curricula parecem perpetuar a bicefalia e dificultar a convergência entre as artes e as ciências da arte. Atitude que denota um posicionamento epistemológico pré-moderno, crente na absoluta especificidade das actividades artísticas (J. Till). Factor que as torna refractárias aos aspectos normativos aplicados a outras disciplinas. Clivagem que perdura por força da manutenção de uma taxonomia disciplinar desfasada do entendimento que os criadores têm da sua actividade e que os próprios académicos também consideram desajustada das Arte Contemporânea. Não precisamos aludir à célebre tríade proposta por Frayling, para perceber que a relação entre a arte e a investigação tem sido experimentada de muitas e variadas maneiras. Nela cabe tanto o carácter ensaístico e experimental da reflexão sobre arte, como o labor eminentemente artístico, processual ou mesmo autoreferencial, seja na experimentação do potencial dos materiais e tecnologias, seja na compreensão e resposta a factores exógenos, como o quadro cultural, institucional, legal e regulamentar em que a criação se apresenta. Assim, tanto aqueles que crêem que a obra plasma a pesquisa, como aqueles que procuram modos de legitimação das artes a partir da dissociação sujeito/objecto ou do mero cruzamento com outros âmbitos humanistas, como a história, a sociologia, a psicologia ou a filosofia, consideram este debate em aberto. Em aberto está também a percepção de uma arte normal e o desejo da excepção, o equilíbrio possível entre o ensino formal e as dinâmicas de vanguarda. É precisamente aí que se encontra o propósito dos artigos agora publicados: discutir experiências de recém-doutorados e doutorandos em áreas artísticas distintas; perceber a perspectiva institucional de responsáveis científicos ou docentes de programas de doutoramento em artes; ensaiar alguma síntese sobre o quadro epistemológio, académico e infraestrutural desejável para o desenvolvimento de investigação pertinente no campo artístico.
Os artigos agora publicados sob a temática “Investigação em artes” resultam de comunicações apresentados nas Jornadas de Investigação em Artes cuja primeira edição teve lugar na Universidade da Beira Interior, a 29 de março de 2019. Rita Sixto no artigo “Pájaros y ornitólogos. Una analogía para pensar la relación entre práctica artística e investigación”, discute a relação entre a prática artística e a investigação universitária a partir do pinto Bernett Newman que foi posteriormente retomada pela produtora de arte contemporânea Consinni e pelo artista Usoa Fullaondo. Em “Investigação em Arte: na recordação da investigação de Doutoramento Mancha Direta”, de Paulo Freire de Almeida revisita a sua Tese de Doutoramento na qual avalia de “que modo a perceção exclusiva de tons, sombras e luz altera o desempenho do aluno” e discute “o que distingue o discurso do artista visual do discurso do historiador de arte ou do teórico”. Mónica Mendes em “Investigação baseada na prática em artes digitais e o Projecto ARTiVIS” aborda os “métodos e práticas artísticas em investigação baseada na prática no âmbito das artes digitais” tendo por referência o Projeto ARTiVIS, cujo enfoque é a sustentabilidade ambiental. Alejandra Pombo no seu artigo “Cosas que importan”, discorre sobre a importância que foi para si, enquanto artista, ter concluído uma Tese de Doutoramento sobre as noções de desejo e de experiência que entrelaçou com a noção de “perencuentro”, enquanto fundamento da sua actividade artística. Em “Here the ghost is me”, Silvia Zayas refere-se à sua Tese de Doutoramento que possui uma estreita ligação com o seu trabalho artístico no qual indaga modos de geração de imagens em movimento através de dispositivos cénicos próximo do fazer cinematográfico. A fechar esta edição temática publicamos “Expressividade no desenho do objecto arquitectónico como consequência de constrangimentos geográficos”, da autoria de Júlio Londrim partilha a sua experiência de Arquitectura Sustentável em Países em Desenvolvimento a partir de uma metodologia por si desenvolvida que tem em conta os constrangimentos físicos e culturais autóctones.
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